Código de Obras
Urbanístico

10 Propostas para suprir as deficiências no Código de Obras de São Paulo

Com base na experiência prática vivenciada junto aos órgãos licenciadores desde a implantação do último Plano Diretor Estratégico (Lei nº 16.050/2014), da Lei de Parcelamento, Uso e Ocupação do Solo (Lei nº 16.402/2016) e do Código de Obras (Lei nº 16.642/2017), identificamos 10 pontos de deficiência neste último.

O Código de Obras trouxe uma evolução significativa em relação ao conjunto legal anterior do fim do milênio, introduzindo novos conceitos e quebrando paradigmas relevantes como a dispensa de licenciamento de obras de baixo impacto urbanístico, dispensa da emissão de Certificado de Segurança, Cadastro do sistema de Segurança e do Certificado de Acessibilidade para algumas edificações, exclusão da figura do Certificado de Mudança de Uso, dentre muitas outras evoluções.

A quebra de paradigma, muitas vezes, é acompanhada por uma resistência natural decorrente de conceitos antigos e ultrapassados arraigados nos agentes públicos e nos intérpretes da legislação que acabam esvaziando ou limitando muito a aplicação dessas novas normas disruptivas.

Com isso, normas complementares acabam sendo necessárias a fim de esclarecer e direcionar a aplicação da legislação, o que, muitas vezes, também não ocorre por receio dos agentes públicos normatizadores em regulamentar a aplicação das leis, relegando a cada agente público (fiscalizador ou licenciante) a interpretação e aplicação da norma jurídica.

Outras normas disruptivas trouxeram conceitos inovadores e muito benéficos à cidade, porém, tiveram aplicabilidade limitada em razão da onerosidade excessiva criada sobre os particulares que evitaram a todo custo incorrer em tais obrigações.

Diante dessa experiência, indicaremos 10 pontos do Código de Obras que poderiam receber atenção especial na regulamentação, a fim de melhorar a dinâmica licenciatória, ou mesmo serem reformados para construir a cidade de forma mais eficiente e inclusiva.

  1. Obras de baixo impacto urbanístico

Problemática: Conceitos muito amplos e aplicação pelos fiscais e outros órgãos de maneira muito restritiva.

Experiência prática: Resulta em travamento de procedimentos de emissão de licença de funcionamento, registro de incorporação ou aplicação de multas

Proposta: Deixar claro que as seguintes reformas estão dispensadas de licenciamento:

(i) alteração no número de unidades autônomas;

(ii) demarcação de vagas de estacionamento;

(iii) instalação de equipamentos;

(iv) construção de áreas técnicas ainda que maiores do que 30m².

  1. Mudança de uso das edificações ou de partes da edificação

Problemática: Recusa da Subprefeitura em emitir licença de funcionamento.

Experiência prática: Muitas das edificações têm tido o processo de licença de funcionamento recusado, uma vez que o uso pretendido é diferente do que consta na planta aprovada.

Proposta: Deixar expresso na legislação que a mudança de uso das edificações não depende de licenciamento. O controle urbanístico é feito por meio da emissão de Auto de Licença de Funcionamento.

  1. Emissão de habite-se

Problemática: Tem sido exigida a apresentação de contrato com estacionamento quando a edificação indica vagas de estacionamento fora do lote objeto do alvará de obras.

Experiência prática: O proprietário do imóvel não é quem vai desenvolver a atividade. Assim, não faz sentido o proprietário ter que firmar convênio com estacionamento para a emissão do habite-se, vez que as vagas de estacionamento estão vinculadas ao uso da edificação e não aos parâmetros edilícios.

Proposta: Dispensar a exigência da apresentação das vagas em imóvel terceiro como condição para emissão do habite-se. Deixar essa exigência para a emissão do Auto de Licença de Funcionamento

  1. Art. 29, §2º, inciso II, do Decreto 57.776/17

Problemática: O dispositivo dispensa da emissão do Certificado de Segurança apenas as edificações que não sofreram alterações de ordem física em relação ao aprovado.

Experiência prática: Fiscais têm autuado prédios por falta de Certificado de Segurança quando realizaram obras dispensadas de licenciamento. Ou até quando o prédio protocola processo de anistia, ou ainda quando obras são executadas em decorrência da emissão do Alvará de Obras, porém, sem que o novo habite-se tenha sido expedido.

Proposta: Retirar do dispositivo legal a frase “que não sofreram alterações de ordem física ou de utilização”. Isentar do Certificado de Segurança todas as edificações que possuem habite-se expedido após 20 de junho de 1975.

  1. Cadastro de equipamentos do sistema especial de segurança

Problemática: Art. 34, §3º, do decreto isenta as edificações da emissão desse documento quando possuírem menos de 02 escadas à prova de fumaça e tiverem AVCB.

Experiência prática: Técnicos de Contru e fiscais da subprefeitura alegam que o decreto 32.936/93 continua válido e exigem a emissão do Certificado de Manutenção do Sistema de Segurança.

Proposta: Esclarecer em resolução ou portaria que o decreto foi tacitamente revogado pelo novo Código de Obras.

  1. Cadastro de edificações – CEDI

Problemática: A alteração do cadastro de edificações para deixar o imóvel irregular ocorre de forma imprudente e sem qualquer aviso ao contribuinte.

Experiência prática: Shoppings e grandes empreendimentos têm ficado irregulares no cadastro em razão de alteração no cadastro imobiliário fiscal do IPTU, ainda que nenhuma obra irregular tenha sido feita. Isso tem deixado os empreendimentos vulneráveis, pois ficam sujeitos à interdição da atividade e cassação da licença de funcionamento.

Proposta: Determinar que qualquer atualização do CEDI para colocar a edificação como irregular depende de prévia notificação ao proprietário para que apresente impugnação em 15 dias. Ao fazer isso, a atualização do cadastro fica suspensa até que o processo seja encerrado.

  1. Desvincular a validade do TCA da emissão do alvará de execução

Problemática: Demora excessiva na emissão do Alvará de Execução e do próprio TCA.

Experiência prática: Os empreendimentos podem iniciar as obras após 120 dias do protocolo do pedido de emissão do Alvará de Aprovação e Execução de Obras, ou após o pagamento da outorga onerosa, se for o caso. No entanto, quando a obra depende da remoção de árvores, fica dependendo da emissão do Termo de Compromisso Ambiental e do Alvará de Execução, o que acaba atrapalhando muito o cronograma de obras e, principalmente de investimento.

Proposta: Permitir que o TCA tenha validade e eficácia plena, independentemente da emissão do Alvará de Execução.

  1. Suspensão de processos administrativos de licenciamento de atividade ou edilício quando há exigência de licenciamento de remediação ambiental

Problemática: Empreendimentos têm sido interditados ou enfrentam ameaça de interdição pela impossibilidade de emissão de Alvará de Licença de Funcionamento (ALF), ou de regularização edilícia, devido a pendências de licenciamento ambiental.

Experiência prática: A Secretaria do Verde e do Meio Ambiente (SVMA) e a Secretaria Municipal de Urbanismo e Licenciamento (SMUL) têm exigido licenciamento ambiental para imóveis que não possuem suspeita de contaminação ambiental, mas que, de alguma forma, estão vinculados a empresas que desenvolvem atividades potencialmente contaminantes.

Proposta: Sempre que houver a solicitação dos técnicos de licenciamento (edilício ou de atividade), o processo administrativo deverá ser colocado em custódia, caso a única pendência seja a conclusão do processo de licenciamento ambiental.

  1. Notificação para apresentar certificado de acessibilidade, certificado de segurança ou certificado de conclusão de obras

Problemática: As notificações previstas nos art. 93 e 94 da Lei 16.642/17 obrigam o proprietário a protocolar pedido de emissão do Certificado de Segurança, Certificado de Acessibilidade e Certificado de Conclusão de Obras em 05 dias, mesmo que sejam isentos desses documentos.

Experiência prática: Os custos de protocolo desses processos são muito altos (R$5,00/m²), principalmente para edificações dispensadas desses documentos. No entanto, se não fizerem o protocolo, estão sujeitos à multa de R$300,00/m², o que faz com que todos os contribuintes acabem aceitando a extorsão dos fiscais e fazendo os protocolos.

Proposta: determinar que a defesa contra essas notificações tenha efeito suspensivo e impeçam a lavratura de multa.

Atualmente apenas a defesa contra a multa gera a suspensão do processo fiscalizatório, mas a multa está lavrada, gerando um passivo muito relevante.

  1. Criação de um órgão consultivo sobre aplicação das normas urbanísticas

Problemática: É comum técnicos de licenciamento aplicarem o mesmo dispositivo legal de forma antagônica, o que gera insegurança jurídica.

Experiência prática: Algumas regras de licenciamento contida no Código de Obras, principalmente aquelas trazem conteúdo não existente nas normas anteriores, acabam sendo aplicadas de forma divergente entre os diversos setores da prefeitura. Coordenadoria de Estudos de Parcelamento do Solo (CEUSO) e Departamento de Uso do Solo (DEUSO) seriam, em tese, órgãos que teriam essa função de esclarecer a aplicação das normas, mas ambos os órgãos têm recusado protocolos de consulta e feito análise apenas de “Diretrizes de projeto”, cujo objetivo é bastante diferente de uma consulta normativa.

Proposta: Determinar que pelo menos um desses órgãos, ou ambos, ou outro órgão a ser criado, tenha função de uniformizar a interpretação normativa, de modo que a população possa protocolar pedido de consulta sobre como aplicar um determinado artigo da legislação.

Descrição: Existem diversos artigos na legislação com essa problemática interpretativa, tais como:

  • Vigência do Decreto nº 32.329/1992, que trata sobre o Cadastro de Manutenção do Sistema de Segurança, frente à promulgação do novo Código de Obras e Edificações (COE), Lei nº 16.642/2017 e Decreto nº 57.776/2017, que instituíram o Cadastro do Sistema de Segurança.
  • Dispensa do Cadastro de Equipamentos do Sistema de Segurança previsto no art. 34, §3º, do Decreto nº 57.776/2017;
  • Dispensa da emissão do Certificado de Segurança previsto no art. 29, §§2º e 3º, do Decreto nº 57.776/2017;
  • Abrangência das “obras estruturais que não abalam a estabilidade da edificação” para fins de dispensa de licenciamento de obras – art. 13, inciso III, da Lei nº 16.642/2017;
  • Estacionamento de bicicletas ser considerado área não computável nos termos do art. 62, inciso I e III, da Lei nº 16.402/2016;
  • Redução do número de vagas de estacionamento para empreendimentos existentes em razão das novas regras previstas na Lei nº 16.402/2016;
  • Conceito de edificação de uso misto para fins de aplicação dos benefícios construtivos da Lei nº 17.557/2021 – Requalifica Centro;
  • Dentre muitos outros exemplos práticos de aplicação das normas no dia a dia.

Veja também: 10 propostas de ajustes para o Plano Diretor Estratégico de São Paulo

Publicações relacionadas